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Maria Antônia – A História de uma Guerra

outubro 10, 2012

Maria Antônia: A História de uma Guerra” resgata parte do movimento estudantil do Brasil perdido no tempo, contado tão somente através das informações dadas pelos jornais da época. Quarenta anos depois da histórica briga entre estudantes da Faculdade de Filosofia da USP e do Mackenzie,o repórter e escritor Gilberto Amendola reconstrói cenas daquele episódio por meio de entrevistas com seus principais personagens,como o ex-chefe da Casa Civil do Governo Lula, José Dirceu,e outros tantos estudantes que hoje podem ser facilmente reconhecidos do cenário nacional.

O triste ano de 1968

maio 16, 2010

por Mário Lopomo

publicado originalmente no blog São Paulo Minha Cidade

De 1964 a 1968, ia se vivendo, como dizia Jô Soares e Arnaud Rodrigues, numa música feita às pressas na entrega do troféu Roquet Pinto, em 1967.

“Para se chegar à Liberdade, temos que passar pelas ruas Argentina, Cuba, Turquia, Rússia, Chile, passava correndo pelas arcadas e pronto”. Aqui jaz a liberdade! Muita coisa estava acontecendo. A cada grupo de protesto que se fazia, vinha a opressão e acabava com o papo.

No dia primeiro de maio de 1967, na Praça da Sé, festa do dia do trabalhador, os policiais cortaram os fios das caixas de som. Uma pedra foi atirada sabe-se lá por quem e foi bater justamente na testa do governador Sodré, que não perdia uma concentração, tentando explicar como tinha conseguido ser nomeado governador “biônico”.

Um mês depois, um carro bomba explodia em frente ao quartel general do Ibirapuera. Antes de explodir, ele invadiu a barreira do quartel, na Rua Manoel de Nóbrega, sendo perseguido pelo soldado Mário Kosél Filho, juntamente com outro praça, um rapaz de cor negra. Quando o furgão carregado de bombas foi jogado no fosso gramado que protegia o quartel, o soldado Mário foi alertado pelo companheiro para não se aproximar muito.

Mário já tinha descarregado seu fuzil nos terroristas, cumprimento do seu dever, e ainda viu o motorista sair do veículo e ser recolhido por um Volkswagen que estava na cobertura. Quando o furgão estava tombado, encostado na parede do quartel, o soldado se aproximou para ver o que era.

E ai o furgão explodiu. O do soldado ficou mutilado, com partes de seu corpo espalhados por todo lado. Uma das últimas partes de seu corpo foi achado em cima da laje do quartel. Era uma de suas pernas.

Tudo fazia crer que dias piores estavam por vir. Quando o ano de 1968 teve inicio, a coisa começou a piorar. E a receita veio do exterior. Na França, estudantes iam às ruas num protesto que há muito não se via, pois a violência campeava. A triste primavera de Praga, quando a Tchecoslováquia estava a caminho da democracia, era outra coisa que entristecia o mundo democrático. Na Alemanha, também muitos protestos, e aí se espalhou pelo mundo todo.

Não poderia ficar de fora o Brasil. Como dizia Chacrinha, “nada se cria, tudo se copia”. Também por aqui estudantes cismavam em fazer seu protesto. Muitas pichações “Abaixo a Ditadura” estavam escritas com tinta preta e é reprisada até hoje como uma das referências contra o movimento militar de 1964.

A UNE (União Nacional dos Estudantes) teimava em fazer o 30º Congresso Estudantil Anual, que estava proibido pelo governo. Mas seria feito clandestinamente, onde não se sabia, era segredo de estado estudantil.
E o lugar escolhido foi um sítio na cidade de Ibiúna. Tudo estava nos conformes. O congresso seria realizado. O governo nem tinha idéia, pois havia um silêncio a respeito da realização desse congresso.
Os estudantes precisavam suprir o sítio de mantimentos para a comida de todos. Para tanto, foram à cidade para comprar o que comer. Só que estupidamente foram muitas pessoas, vários carros, o que chamou a atenção dos pacatos moradores daquela tranqüila cidade. Uma denúncia foi feita, a polícia se comunicou com o DOPS.

Na caixa d’água, tinha alguém de olho para avisar em caso de a policia chegar. Mas mesmo assim, quando menos esperavam, muitas viaturas e policiais estavam cercando o sitio e todos foram presos. Foi necessário contratar muitos ônibus para levar toda a rapaziada para o DOPS. Ali ficaram os líderes; os demais responderiam ao processo em liberdade.

A coisa ia de mal a pior. Eu, como andarilho inveterado, estava sempre pelo centro da cidade. Chegava sempre pelas vinte horas. O Anhangabaú era o piso inicial das minhas caminhadas. Uma noite estava insustentável permanecer no centro. Uma barulheira infernal, sirenes ecoavam por todo lado.

Parece que um carro com estudantes tinha explodido na Rua da Consolação com dois rapazes dentro, um de origem oriental. Quando estava para atravessar a Rua Formosa, caminho que eu fazia, pois por aqueles lados era onde a coisa mais fedia, e eu queria ver de perto, eis que um brucutu da força pública se punha bem a minha frente. Parecia um tanque de guerra. Piscava luzes por todo lado. Voltei correndo para casa. Uma das poucas vezes que fui dormir cedo nos tempos de andarilho.

Passado aquele burburinho, eis que outra refrega estava acontecendo. Era na Rua Itambé com a Maria Antonia. Uma verdadeira guerra entre a filosofia da USP x Mackenzie. A coisa ficou por uma semana daquele jeito. Bombas eram atiradas de lado a lado. Eram fogos de artifício, bombas molotov de fabricação caseira, pedras, paus, fogos de artifício e armas de fogo. E um desses tiros acertou o estudante José Guimarães, de 20 anos, um secundarista do colégio Marina Cintra, da Vila Mariana, do outro lado da cidade.

O barulho maior era de fogos de artifício, o que facilitava quem usava arma de fogo. Milhares de universitários e secundaristas, chefiados por José Dirceu, presidente da UEE (União Estadual dos Estudantes), espalhavam o terror pelas ruas do centro da cidade de São Paulo, trazendo nas mãos pedras, paus e alguns rojões gritando “slogans” contra o governo, assustando os paulistanos que circulavam pela cidade. Viaturas oficiais foram apedrejadas, amassadas e até incendiadas. A força pública e o DOPS passaram a intervir, efetuando prisões inclusive de jornalistas.

No dia seguinte à morte do estudante José Guimarães, os estudantes realizaram uma grande passeata pelas ruas da cidade. A força pública, mais uma vez, se fez presente em massa, agora com armamento pesado, fuzis, metralhadoras, bombas de gás lacrimogêneo e cinco carros de combate. Além dos estudantes, estavam artistas de teatro que tinham seus espetáculos invadidos pela policia repressora (como aconteceu em julho, durante o espetáculo Roda Viva, no teatro Galpão). Juntando-se a eles, ou o povo consciente, ou os baderneiros de sempre.

A passeata saiu da Praça da República, seguindo pelas avenidas Ipiranga, São João. Na Barão de Itapetininga, uma chuva de papel picado saudava os manifestantes. Mas quando ele entraram no Largo São Bento, o cassetete cantou feio. A tropa de choque da força pública os esperava ali. E aí foi um Deus nos acuda: saiu borrachada para todo lado, gente gritando, uma correria infernal, com bombas de gás explodindo em todos os cantos; cenas lastimáveis foram vistas naquele dia.

A maioria que conseguiu escapar foi para o Largo do Anhangabaú, quando atingiram o largo da memória promoveram um comício relâmpago e depois quebraram os vidros do Citibank. Quando eu retornava da Rua Maria Antonia diante daquele absurdo de briga entre duas faculdades, estava atônito: “meu Deus, isto parece o Vietnã”. Não era o Vietnã. Era a própria cidade de São Paulo em estado diferente do que se podia imaginar, uma autêntica cidade em guerra.

Bastante indignado com o que tinha visto, voltei para casa. Quando estava esperando a abertura do semáforo da Rua São Luís com Consolação e Ipiranga, vi uma mulher chorando. Ela retornava para casa, depois de mais um dia de trabalho como faxineira dos escritórios daquela área da cidade, como muitas outras que trabalhavam depois do horário comercial, das 18 às 22 horas.

Em seu desespero, dizia, bastante assustada: “Meu Deus, que coisa horrorosa! Eu vi um menino morto, ali na calçada perto do Mackenzie, um outro estava ferido com o rosto sangrando”. “Não queria estar na pele dessas mães. Até quando vai durar isto? Há uma semana que essa turma briga sem parar”, dizia ela a quem estivesse por perto.

– Sabe quando isso vai acabar, senhora? – disse-lhe eu, em voz bastante alta. Quando estes nossos políticos criarem vergonha na cara. Eles têm medo de se expor para não serem cassados ou presos, e mandam seus filhos fazerem essa baderna toda, sabendo que eles, sendo menores, não serão presos e responsabilizados por esses atos.

– A senhora já ouviu falar em Wladimir Palmeira?

– Não, garoto. Não ouvi falar não – respondeu ela.

– Pois eu lhe digo. É filho de um político lá do nordeste. Ele e o presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) gritam, esbravejam, fazem passeata pelo Brasil todo. Logo será preso, aí vai levar um pau. E depois dizer que só estudante é perseguido e preso pela policia. Coisas de mártir da democracia.

– A senhora leu o jornal da tarde de hoje?

– Não, não li não.

– Pois bem. Lá tem uma reportagem dizendo que o presidente da UEE (União Estadual dos Estudantes), José Dirceu, é um estudante desocupado, mora no CRUSP e vive às custas dos estudantes, que ficam nos semáforos pedindo dinheiro para financiar suas idas e vindas. Sua função nas horas vagas é dar em cima das meninas idiotas que acham que ele é o maioral. Amanhã ou depois vai aparecer como arauto da democracia.

E assim dizia eu àquela simplória senhora, que de política não sabia nada, coitada. Ou melhor, que bom que ela estava de fora.

As noites de 1968 já não eram as mesmas de dois anos antes, quando a gente circulava livremente por todas as ruas do centro de São Paulo, sem o perigo de tomar um tiro pelas costas. Os boêmios eram felizes e circulavam por todos os bailes da cidade: Badaró, Som de Cristal, Cartola Clube, Club Homs e até o famoso Vila Sofia, no longínquo bairro de Socorro, em Santo Amaro.

No João Sebastião Bar, nos bares da Rua Nestor Pestana, onde a TV Excelsior estava na corda bamba. Nos bares da Galeria Metrópole; lugares estes onde muita letra foi feita para os festivais de música popular e os shows do Teatro Paramount. São Paulo era o centro da cultura brasileira, a alegria era contagiante, com a turma da jovem guarda dando seu recado simples e gostoso.

E para quem não gostava daquele movimento que mudava radicalmente os costumes de uma sociedade, até então conservadora, tinha o fino da bossa com a alegria e o sorriso permanente de Elis Regina. Isso tudo tinha ficado para trás, as nuvens estavam cada vez mais cinzentas.

As noites de 1968 estavam tristes, até a lua não brilhava como antes; mesmo estando cheia, ela não reluzia a felicidade dos namorados, mesmo porque eles também estavam macambúzios cabisbaixos. Havia sempre o medo que algo viria em cima da cabeça de alguém. Resolvi voltar para casa, passei pela Rua Sete de Abril e comprei um jornal Diário de São Paulo.

Fui direto na coluna de Paulo Bonfim. Poesia nessa hora faz muito bem. Parece que o poeta andava muito aborrecido. Não estava nos seus melhores dias. Em sua coluna, ele parecia bastante melancólico, escrevia pensamentos os quais intitulou de Fragmentos.

“Os telefones andam assombrados, tocam e apenas o silêncio responde.

Há dias em que sofro de ausência e de presença, criaturas, objetos e fatos me parecem estranhos e irreais.

Ando farto de lucidez, faminto de sonhos, que não consigo sonhar.

Em armazéns subterrâneos, as palavras colhidas ontem principiam a apodrecer.

Há momentos eternos em dias efêmeros.

Enquanto houver no mundo um homem querendo impor ao outro a verdade, não haverá paz.

A rua está ficando exausta de meus passos.”

Quando a primavera brasileira estava prestes a chegar, quando as árvores ficariam mais verdes, as flores desabrochariam, havendo perspectiva de dias mais felizes, eis que a infelicidade, um deputado, o Márcio Moreira Alves, resolveu estragar tudo.

Deputado que era, pensando que tinha imunidade parlamentar e, portanto, podia falar o que bem queria. Disse em alto e bom som na tribuna dos deputados em Brasília que ninguém deveria comparecer ao tradicional desfile de Sete de Setembro, dia da pátria. Disse mais: “Para que as jovens formandas não convidassem cadetes de qualquer área das forças armadas para paraninfos nas festas de formaturas.”.

Pronto, mais um estopim a ser aceso. O governo militar pediu licença à câmara federal para processá-lo. Muitas seções se davam, ou não, permissão em processar o parlamentar. Numa seção histórica, estavam presentes 372 parlamentares, 249 da Arena e 123 do MDB. Não compareceram 37 deputados, dos quais 32 governistas e 5 do MDB.

Os arenistas Veiga Brito e Edmundo Monteiro não votaram por chegarem após o encerramento da votação. Após a contagem dos votos, o presidente da câmara, deputado José Bonifácio, anunciou o resultado: 216 deputados rejeitaram o pedido para processar o deputado Márcio Moreira Alves, e 141 optaram por processá-lo, 12 se abstiveram de votar (todos da Arena). Sendo assim, a Câmara dos Deputados resolveu não permitir que o deputado fosse processado por ter imunidade parlamentar.

Ao final da reunião, foi uma baderna. Gritos de viva a liberdade. A campainha da presidência era tocada com insistência pedindo silêncio. Os deputados puseram-se a cantar o Hino Nacional Brasileiro. Até o presidente da câmara, o arenista José Bonifácio, se levantou e, respeitosamente, também cantou. Uma grande festa da “democracia” brasileira.

Festa essa que durou pouco, porque numa reunião às pressas, o governo, presidido por Artur da Costa e Silva, assinou o ato institucional nº 5, fechando o congresso e, conseqüentemente, fechando tudo, naquele dia 13 de dezembro, que foi considerado o último ato político do ano.

No dia 31 de dezembro daquele ano, foi ao ar a última edição do repórter Esso, sob forte emoção do locutor Roberto de Oliveira que, por segundos, teve que ser substituído por um outro que estava ao lado, retomando logo a seguir a última leitura de um dos mais laureados noticiários. Ouvíamos também, pela ultima vez, sua característica musical. 1968 é, também, considerado o “Ano que não terminou”.

e-mail do autor: mlopomo@uol.com.br

68 – Dezembro, em Brasília!!

dezembro 22, 2008

Por Olguinha Salati

As lembranças são escassas, tal qual a memória.

Fafi_em_Brasilia-1968-a Mas é fato: monitorados pelo Prof. Aluisio Aragão, partia da FAFI – Rio Claro, atual UNESP, naquele dezembro/68, um ônibus de alunos de Pedagogia, em direção à Brasília!

Objetivo: estagiar junto ao CIEM (Centro Integrado de Ensino Médio) da Universidade de Brasília, verificando a prática de um Projeto de Ensino que integrava todos os componentes do Quadro Curricular, num único eixo temático: Vida e Trabalho.

Atividade dirigida aos concluintes/68 de Pedagogia, as vagas existentes puderam ser preenchidas por alunos das demais séries do Curso. Acredito que a edição do AI-5 acabou provocando desistências e assim, embarcamos (um grupo de 6 primeiro – anistas) na excursão para o estudo do meio na UnB.

Revendo o contexto da época, compreendo com facilidade os motivos da preocupação de nosso zeloso mestre. O ano letivo tornara-se um turbilhão: alunos excedentes, assembléias permanentes, XXX Congresso da UNE violentamente reprimido, alunos, professores, políticos, artistas e figuras de expressão devidamente amordaçados e sumidos, informantes infiltrados nos movimentos organizados e salas de aulas.

Os posts existentes neste blog a respeito da situação propiciam um panorama do clima reinante.

Fomos alojados (inicialmente ficaríamos na própria UnB) em residências de professores da Universidade, que se dispuseram a tal, contatados pelo Prof. Aragão. Andávamos sempre em grupos, devidamente atentos e cautelosos com a presença do exército por toda parte.

Assim, cumprimos nossos contatos numa já silenciosa e silenciada UnB (entrevistas com poucos professores e alunos disponíveis, alguns coordenadores e leitura de material didático produzido) e visitamos as iniciadas construções que tornariam Brasília, mais tarde, referência em arquitetura.

Fafi_em_Brasilia-1968 As poucas fotos que tenho da época, duas delas aqui publicadas, bem como os artigos e informações deste blog, permitem concluir que a capital federal era um perfeito terreiro de obras lamacento, não só no sentido físico-estrutural, mas também político-social.

1968 – A anti-tese

dezembro 11, 2008

68-france-brasil

por Eduardo Sposito

A idéia básica é tentar mostrar o que representou aquele ano – aquele período – para um jovem que viveu a agitação numa cidade grande e fugir um pouco das grande teses sociológicas e políticas que já foram feitas sobre o período. (Aliás, acho que esta é a grande contribuição deste Arquivo.)

A primeira afirmação contraditória (e herética, espero): a luta aqui desenvolvida não tinha nada a ver com o “maio de 68” na França e na Europa.

Digo isso do ponto de vista daquele jovem envolvido nas lutas que se travavam contra a ditadura e para a construção do socialismo sonhado e imaginado, antes de 68.

O máximo que podia representar aquilo que acontecia na França, na Europa toda e até nos EUA com o poder jovem, e o fato de estimular nossa luta.

Nossa identidade era mais com os movimentos da América Latina (Tupamaros, Montoneros, Sendero Luminoso, Mir…) com Cuba, Vietnã e até a China…

As palavras de ordem para a grande massa jovem vinha da música, poesia, teatro, cinbema, literatura e artes em geral, produzidas aqui e na América Latina.

Nossas fontes eram Chico, Caetano, Gil, Vandré, Boal, Guarnieri, Thiago de Mello, Dom Helder, Guevara, Vitor Jarra, Violeta Parra, Neruda, Zé Celso, Josué de Castro, Celso Furtado, Paulo Freire, Darci Ribeiro, Caio Prado, Nelson Werneck, Glauber, Marighela, Lamarca… (Pode parecer uma salada ideológica… e era mesmo.)

O maio de 68 nos pareceu (já naquela época) uma tentativa da jovem esquerda européia de participar do que estava ocorrendo no terceiro mundo, em especial no Vietnã, em Cuba e na América Latina. O filme “A Chinesa” do Godard, me parece, demonstra isso. Mas era um movimento burguês, como demonstram entrevistas atuais com as lideranças da época, especialmente Cohn-Bendit.

A verdadeira revolução que estava acontecendo entre nós(conforme tentei demonstrar numa das Cenas-68, citando Roberto Freire) era a incorporação em nosso dia-a-dia do modo de viver socialista, na construção do coletivo. Para nós não só o trabalho, a produção seria socializada, mas o amor, os sonhos tenderiam para o coletivo. O amor pela pessoa amada era um símbolo e uma concretização do amor por toda a humanidade(As relações com a Igreja do Vaticano II e com as CEBs eram muito fortes.)

Quem não entender isso, não vai entender porque tantos jovens renunciaram à propria vida, muitos morrendo nas mãos da reperessão e das guerrilhas urbana e rural.Costumo dizer que não queríamos tomar o poder; queríamos apenas fazer a revolução

(Infelizmente em muitos países só se tomou o poder e não se fez a verdadeira revolução: não se mudaram as relações de produção da vida, que levariam à mudança nas relações sociais etc.. Mas não adianta, ninguém mais acredita no velho Marx)

Aqui também houve o equívoco da tomada do poder (como se fosse possível resistir naquele momento ao imperialismo americano) e as lideranças usaram esse potencial revolucionário dos jovens na aventura de derrubar a ditadura( que não era o inimigo: era apenas a forma que o inimigo (o capitalismo) assumia naquele momento.)
E o verdadeiro potencial revolucionário foi de roldão com a derrota da luta armada.

Quarenta anos depois, olhando aquilo que passamos, o drama não é achar que fomos derrotados. É perceber que estávamos certos. A revolução ainda está aí por se fazer. E ele tem que ser feita, para não tornarmos verdadeira a frase do Ivan Lessa no saudoso Pasquim:” o ser humano é inviável”.

E hoje, depois de 10 meses de imersão total na minha “comunidade de base” na periferia de Rio Preto, constato que a revolução não só é necessária, mas viável. Os “manos e as minas” não se cansam de me mostrar os caminhos a serem percorridos. Faltam apenas os caminhantes e a canção ( Entra a trilha sonora :”A Estrada e o Violeiro” de Sidney Miller, na voz de Nara Leão:”Sou violeiro caminhando só…)

Mas não desanimo. Da próxima vez a gente chega mais perto

CANNES 68: O CHOQUE DE MAIO

dezembro 9, 2008

Considerado por jovens cineastas representante do conservadorismo, o Festival de Cannes não passou incólume às revoluções do período.

Por Alexandre Figueirôa, colunista do O Grito!

Os anos 60 foram efervescentes sob diversos aspectos, e o cinema, como era de se esperar, refletiu as grandes mudanças da sociedade registradas no período. O Festival de Cannes também não escapou da onda de renovação e contestação que se espalhou pelos quatro cantos do planeta. Mas, 1968 foi, sem dúvida, o ano chave desse processo de transformação. E o maior evento cinematográfico do mundo viu o glamour e o desfile de astros e estrelas, no Palácio do Festival e na Croisette, ser rapidamente substituído pela contestação e pelo debate político.

Na verdade, o estado de tensão no cinema francês já estava acionado desde fevereiro, quando o então ministro da Cultura, o escritor André Malraux havia afastado, por razões políticas, Henri Langlois da direção da Cinemateca Francesa. O episódio, mobilizou cineastas, críticos e transformou a redação da revista Cahiers du Cinema no quartel-general de resistência. Depois de inúmeros manifestos e passeatas, Malraux recuou, e Langlois, no início de maio, foi reconduzido ao cargo. Entretanto, a paixão política havia contagiado todos os envolvidos no acontecimento.

 

O artigo completo foi publicado em Revista O Grito. Para continuar a leitura do artigo, clique aqui.

A Geração Paissandu

dezembro 5, 2008

 Pesquisando sobre cinema em 1968, encontrei um artigo muito interessante de Rui Castro sobre o tema. Trata-se de Geração Paissandu. O texto relaciona cinema e memória da época. Cabe muito bem, portanto, em Arquivo68. Publicamos, como aperitivo, o início do artigo.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 Os menores de 30 anos podem não acreditar, mas já houve um cinema no Brasil – uma sala de espetáculos, quero dizer – que resumiu todo o cenário de uma época e, em seu tempo, batizou uma geração que a protagonizou. O cinema era o Paissandu, uma modesta sala de 742 lugares na rua Senador Vergueiro, no bairro do Flamengo, no Rio. A época, os anos 1964-1968, os quatro primeiros do regime militar (que ainda se envergonhava de ser chamado de ditadura). E os jovens que o freqüentavam eram então conhecidos (mais pelos seus detratores) como a Geração Paissandu – uma vasta classificação que incluía rapazes e moças radicais em arte, política e comportamento, embora alguns ainda tivessem de dar satisfações à mãe quanto à hora de chegar em casa.

Os ecos do que se passava em torno da tela do Paissandu e nos bares adjacentes eram ouvidos em todo o Brasil daquele tempo e, se calhar, até em Paris. Ali, entre as montanhas de cartões de chope nos botequins e aos sussurros na sala de espera do cinema, antes do começo das sessões, derrubou-se incontáveis vezes a ditadura, libertou-se o Vietnã e decretou-se a vitória definitiva do jeans (da marca Lee) sobre o vinco impecável. Grandes tempos para quem os viveu. Certa noite, no entanto – a de 13 de dezembro de 1968, uma sexta-feira –, a Geração Paissandu silenciou sem dizer água vai, e meio que para sempre. Silêncio este que, como tudo mais, passou despercebido, porque a insegurança e o medo impostos pelo Ato Institucional nº 5, baixado naquela noite, engoliram todo mundo.

Para quem se interessou, mais pode ser encontrado em Digestivo Cultural, clicando aqui.

Brasil 1968 – do tiro no Calabouço ao AI-5

novembro 29, 2008

 Já publicamos, aqui, um artigo de Jeocaz Lee-Medi, GAL COSTA 1969, O ÁLBUM QUE FECHOU 1968. Em relação a 68, em seu blog ele também já publicou 1968, O ANO DE TODOS OS GRITOS; PARIS, MAIO DE 1968 e PRAGA 1968, FLORESCIMENTO E MORTE DE UMA PRIMAVERA.

Em seu último post sobre o ano, Jeocaz traça um panorâmica de 1968. Para despertar o interesse, reproduzimos, aqui, o início do artigo.

 

O ano de 1968 foi marcado pelas ebulições políticas e sociais que assolaram o mundo. A Guerra Fria instalada após a Segunda Guerra Mundial criou dogmas filosóficos, ideologias revolucionárias, e ditaduras que defenderam dois blocos políticos, o bloco americano e o bloco soviético. 1968 veio e contestou todas as ideologias e sistemas vigentes, atrás da contestação político-ideológica, os costumes sociais da sociedade ocidental vieram abaixo, trazendo novos comportamentos, inseridos na repressão dos governos ditatoriais tanto de direita, como de esquerda.

Se o mundo foi abalado, gerando os tumultos estudantis na Europa, que culminaram com as manifestações de maio em Paris, com a contestação do regime socialista na extinta Tchecoslováquia e a sua Primavera de Praga, no Brasil estas contestações não passaram despercebidas, sendo assimiladas de uma forma convulsiva que culminaria com o fechamento do Congresso Nacional em dezembro e o fio ínfimo de liberdade que ainda se podia respirar sendo finalmente estrangulado.
Liberdade comportamental não rimava com um governo ditatorial. (…)

Para continuar a leitura, clique aqui

Prá Tonga da Mironga

novembro 17, 2008

 

Logo depois do artigo “Quem te viu, quem te vê, MBP!, recebo, por e.mail, o seguinte texto de Olga Maria Salati Marcondes de Moraes, a Olguinha:

Na revista Brasil: Almanaque de Cultura Popular, editor Elifas Andreato, novembro/2008 – distribuída nos vôos da TAM, (você certamente já deve ter visto), a chamada de capa é:

O ano em que o Brasil escureceu – os ideais revolucionários de 1968 interrompidos pela sombra do AI-5.

 Há uma boa reportagem: Cenas de um ano que não terminou, com uma panorâmica sobre os fatos e fotos que tornaram tão significativo aquele ano prá todos nós.

Ao final, faz referência ao livro do Zuenir, já conhecido e também a uma edição de fotojornalismo denominada – 1968 Destinos 2008: A passeata dos 100 mil, de Evandro Teixeira (Textual, 2008). 

Você já conhece? Parece uma composição interessante: o Evandro, que é fotojornalista, retoma as fotos que fez da passeata dos 100 mil em 68, seleciona pessoas que dela participaram e novamente entrevista-as 40 anos depois. Acho que é isso, pois não vi o livro. Vou procurá-lo aqui em Soroca City. Poderia ir para a bibliografia do Arquivo 68, não? 

Caso tenha lido, que tal rabiscar um post?

Pode me mandar prá Tonga da mironga (isto é dos anos 60!)… além de não escrever ainda fico pedindo e sugerindo coisitas!

 Prometo encerrar.

Abraços

Olga

Olguinha, como percebes, mesmo sem ter lido a revista e ainda sem conhecer o livro, rabisquei o post. Estou aprendendo a ser “criativo”. Pode também me mandar prá Tonga da mironga. Mereço.

Küller

Quem te viu, quem te vê, MPB!

novembro 14, 2008

Por Olga Maria Salati Marcondes de Moraes

mpb-fotohistorica

Meses atrás, encaminhei esta foto histórica da MPB a meus jurássicos colegas de faculdade, entre eles Küller, Tonhão, Chico e Eli, a quem o Jarbas carinhosamente denominou “os meninos de Rio Claro”.

Küller me respondeu com um desafio: esta foto daria um post para o Arquivo 68!

O tempo passou e antes que 2008 termine, decidi publicá-la.

Há bom material (Música em 68 e afins) já postado neste blog e muita coisa disponibilizada na INTERNET (estão lá, por exemplo: “Projeto 40 Anos de 68: relembrar, celebrar e entender” – da UFRJ, MIS e Secretaria de Cultura RJ; “A arte engajada e seus públicos”  (1955/1968) de Marcos Napolitano, trabalhos sobre as manifestações culturais e artísticas da época).

A riqueza da foto está em reunir mostra dos cantores/criadores das diferentes tribos existentes à época (clique sobre a foto para aumentá-la).

Quem viveu e cantou os anos 60 sabe que é um time de primeira! E os modelitos também.

Depois de 68, o Bar do Zé

novembro 8, 2008

 Cheguei tarde a um dos cenários mais importantes dos acontecimentos de 1968: a Rua Maria Antonia, em São Paulo. A região em torno dela foi chamada pelo Cláudio Tozzi de “Nosso Quartier Latin“. Quando cheguei, o grito da rua já tinha se calado. Sobrava o brilho e as luzes da noite e os murmúrios nos botecos.

O mapa incluído à direita já estava alterado. O Mackenzie permanecia no mesmo lugar. Continuava à direita, mesmo para quem subia pela Dr. Vila Nova. As unidades da USP já tinham ido para a Cidade Universitária. Um dos exércitos da Batalha da Maria Antônia havia abandonado o campo para o inimigo. Mas, a resistência continuava ativa nos bares.

O Bar do Zé foi o primeiro boteco da Maria Antonia em que entrei. Nada muito político ou boêmio ou romântico. Foi lá que comi um sanduíche na parada para o almoço do processo de seleção para trabalhar no SENAC. O SENAC ficava ali perto. Menos de 50 metros, descendo pela Rua Dr. Vila Nova. Vindo de Rio Claro, recém-formado em Pedagogia, cheguei lá por acaso. Procurava o meu primeiro emprego.

Não sei porque escolhi o Bar do Zé para fazer aquela refeição rápida. Nem o aspecto externo e muito menos o interno o recomendavam. Muito antes das sucessivas reformas por que passou, era pequeno, estreito, escuro, feio… Chegou a ser carinhosamente chamado de “Sujinho”. Naquele dia não sabia que alí,  naquela pequena chapa sobre o balcão, era feito um dos melhores sanduíches da cidade. Aquele lanche, em janeiro de 1972, foi o primeiro de muitos. Não tomei cerveja naquele dia.

Pensando bem, talvez a escolha do local daquela primeira refeição não tenha sido totalmente por acaso. O Bar do Zé tensionava o espaço pela sua posição geográfica. No alto, dividia ao meio a Rua Maria Antonia.  Postado na esquina com a  Dr. Vila Nova, e por ela, dava acesso fácil ao Teatro do SESC, ao Sem Nome e à região das boates e das madrugadas agitadas da Rua Major Sertório.

Pela esquerda, descendo a Rua da Consolação, quase induzia os passos para o Redondo e para o Teatro de Arena. Subindo a Consolação, com uma boa caminhada que pedia apenas pernas fortes, chegava-se ao Bar das Putas e mais adiante ao Riviera e ao Belas Artes.

À direita, em direção ao Makenzie, o Bar do Zé dava acesso à uma sucessão de outros bares que nunca freqüentei. A direita nunca foi a minha direção preferida. De sua posição privilegiada, o Bar do Zé podia ser o início, o descanso ou o término das andanças do dia ou da noite.

O futuro iria revelar que também não foi estranha a combinação do trabalho com o Bar do Zé, que aconteceu já no início. No Bar e Lanches Faculdade, o nome oficial do boteco,  fiz curso de política. Um curso que consistia em tomar contato com distintas posições ideológicas e suas análises do momento. Um curso com uma parte prática importante: examinar as decisões cotidianas à luz de posições políticas definidas. Mas, isso já é outra história.