Archive for maio \21\-03:00 2009

Outra vez BOAL

maio 21, 2009

 

Por Eduardo Sposito

Quero aproveitar pra contar mais alguma de minha relação a distância com o Boal. Queria até chamar de “Canto do exílio” ou o Exílio no meu canto, já que nós que não saímos do país porque não éramos tão importantes para a ditadura, tivemos que amargar o nosso cantinho dentro da pátria.

No ano da desgraça de 69, acabei ficando desempregado. Consegui em 1970 algumas aulas de Português num curso de madureza em Vila Galvão, Guarulhos. Acontece que o curso estava que só dava prejuizo, por isso os sócios abandonaram o barco. Eu não pude porque tinha casado e morava no prédio onde funcionava o dito curso. Acabei herdando o prejuizo e virei proprietário da dívida. Tive sorte pois aumentou o número de alunos e eu conseguia pagar o aluguel e às vezes os professores.

A coisa era braba. De manhã eu ia pra faculdade e voltava para casa à tarde, sem café da manhã e sem dinheiro pro pastel de palmito nos barracos da Usp. Alguém aí já andou na rua olhando pro chão pra ver se alguem possa ter perdido dinheiro… já passei por essa no trajeto pelo vale do Anhangabau. Quando sobrava uns trocos, comprava aquela Paçoca da Confiança – era uma delicia: sem muito açúcar e feita mesmo de amendoim, sequinha sem ser esfarelenta. Tão boa, que logo tiraram de circulação.

Mas o que tem a ver o Boal com isso? É que no curso de madureza, assumimos o papel de promover o que na época se chamava conscientização dos alunos. Tínhamos até assessoria do PC do B pra isso. Então fizemos um grupo de teatro e fomos assistir um espetáculo no Arena, especial para estudantes. Aí nos encontramos (não presencialmente, como se diria hoje) através dos textos. E o nosso contato foi através do texto do Espetáculo “Chiclete & Banana”, de Boal e Chico de Assis, cujo LP tenho até hoje.

É um texto altamente didático sobre o imperialismo cultural através da música, mostrando o samba que sai do morro e entra no circuito Miami-Copacabana, fazendo a trilha sonora da política da boa vizinhança e voltando “pro morro, onde está o meu cachorro vira-lata, minha cuica, meu ganzá.” Mostra a exploração via mambo, rumba, bolero “made in USA”. E introduzindo o famoso samba de Jackson do Pandeiro, conclui: “só iremos mascar o seu chiclete, no dia em que eles comerem a nossa banana.”

 E como dizia o texto do Arena conta Zumbi: “Assim passei os dias que me deram pra viver…

Reparo histórico

maio 15, 2009

helderfleury

Morei em São Carlos-SP, nos anos 80.
A cidade exibia um conservadorismo exacerbado, especialmente
no que se refere ás suas chamadas “elites”. Isso se refletia, claro,
na Câmara Municipal e no poder público. Prefeitos foram eleitos
com a força e influência dessa gente. Ocorreu, nessa época, outro
fato lamentável que considero estreitamente relacionado com essa
mentalidade.

Um livro foi queimado em praça pública na praça central da cidade.

Um espetáculo típico da pior censura e perseguição ideológica.
Era um livro didático utilizado na escola pública que continha
um poema sobre o Natal e falava em Cristo em sua dimensão humana
e criticava o consumismo da data em oposição aos sentimentos
cristãos.

A mesma São Carlos que colocou o nome de um torturador em
uma de suas ruas e que agora se redime. É uma boa notícia, que
o professor Caio N. de Toledo, da Unicamp, comenta em seu
artigo reproduzido abaixo.

São Carlos repudia torturador
14 de maio de 2009

Na incessante luta pelo aprofundamento da democracia política no Brasil, os vereadores de São Carlos, SP, foram responsáveis por uma decisão histórica: na tarde do dia de 12 maio, por unanimidade, os vereadores dessa cidade aprovaram um projeto de Lei que altera o nome da rua Sérgio Paranhos Fleury. A partir dos próximos dias, com a sanção da Lei pelo prefeito municipal, a rua passará a se denominar D. Hélder Pessoa Câmara.

Certamente, este ato em nada mudará o cotidiano dos moradores da rua nem dos demais habitantes da cidade. No entanto, na batalha em defesa do “direito à memória e do direito à verdade” sobre os fatos ocorridos durante a ditadura militar, a decisão dos vereadores de São Carlos tem um inestimável valor simbólico.

Por meio deste ato, um dos mais violentos e sádicos torturadores da ditadura militar – cujo nome foi imposto à cidade por meio de decreto de um obscuro prefeito, no ano de 1980 – em breve, deixará de ser lembrado pelos habitantes de São Carlos: pelos que transitam pela rua, pelos registros dos imóveis, pelas correspondências recebidas por seus moradores etc.

Mais do que isso: todos progressistas e democratas do país que conheceram a sinistra e brutal atuação desse policial – sempre acobertado e respaldado pelos altos escalões militares -, ficarão aliviados com este ato de justiça reparatória. Depois de quase 29 anos, a vexatória homenagem – conferida ao policial que comandava sessões de torturas nos sinistros porões da OBAN/DOI/CODI e que foi agente direto em ações que resultaram nas mortes de combatentes da ditadura militar – será, finalmente, varrida da cidade.

Simbólica e singular vitória dos democratas e progressistas que reconhecem e respeitam a memória de brasileiros e brasileiras que tiveram suas vidas sacrificadas no combate à ditadura militar.

Dupla derrota dos que ainda hoje cultuam a ditadura militar: é escorraçado da cidade de São Carlos o nome de um dos “heróis” do regime militar; em seu lugar entra o pequeno e frágil, mas, sempre destemido, “bispo vermelho” – D. Helder Pessoa Câmara.

A decisão dos vereadores de São Carlos – tendo à frente o presidente da Câmara, Lineu Navarro (PT), e apoiada vivamente por entidades em defesa dos direitos humanos, por acadêmicos de várias partes do país, estudante, artistas, jornalistas etc. – deveria se constituir em exemplo para todos legislativos brasileiros.

A defesa do “direito à memória e do direito à verdade” deve implicar também a luta pela ressignificação dos nomes de nossas ruas, praças, edificações públicas etc. que hoje cultuam os “heróis” e os patronos da ditadura militar de triste memória no Brasil.

Caio N. de Toledo
Professor da Unicamp

Jornada nas Estrelas

maio 14, 2009

spockSpock, Kirk, Magro, Checkov, Sulo foram heróis que frequentavam a telinha em minhas horas de lazer na segunda metade dos anos sessenta. Eles eram alguns dos personagens de Jornada nas Estrelas, saga da busca de outros mundos por um universo sem fim. O número de fãs da série era imenso. E a história ainda rende novos filmes e séries na TV. Um ícone da nossa geração.

Acabo de encontrar uma matéria sobre  curso de história na San Diego State University cujo título é Star Trek (Jornada nas Estrelas).  É um programa acadêmico que vale créditos como qualquer outro.  O professor que o planejou, John Putman, explica que muitos episódios de Star Trek fazem referência aos grandes temas culturais e políticos dos sessenta: direitos civis, guerra do Vietnam, contracultura, revolução sexual etc.

Escrevi mais sobre o curso e a proposta do professor Putman no Boteco Escola. Para chegar lá, clique no destaque abaixo.

Ato público contra o AI-5 digital

maio 13, 2009

ato_contraAI5digital

A Internet é uma rede de comunicação aberta e livre. Nela, podemos criar conteúdos, formatos e tecnologias sem a necessidade de autorização de nenhum governo ou corporação. A Internet democratizou o acesso a informação e tem assegurado práticas colaborativas extremamente importantes para a diversidade cultural.
A Internet é a maior expressão da era da informação.

A Internet reduziu as barreiras de entrada para se comunicar, para se disseminar mensagens. E isto incomoda grandes grupos econômicos e de intermediários da cultura. Por isso, se juntam para retirar da Internet as possibilidades de livre criação e de compartilhamento de bens culturais de de conhecimento.

Um projeto de lei do governo conservador de Sarkozi tentou bloquear as redes P2P na França e tornar suspeitos de prática criminosa todos os seus usuários.O projeto foi derrotado.

No Brasil, um projeto substitutivo sobre crimes na Internet aprovado e defendido pelo Senador Azeredo está para ser votado na Câmara de Deputados. Seu objetivo é criminalizar práticas cotidianas na Internet, tornar suspeitas as redes P2P, impedir a existência de redes abertas, reforçar o DRM que impedirá o livre uso de aparelhos digitais. Entre outros absurdos, o projeto quer transformar os provedores de acesso em uma espécie de polícia privada. O projeto coloca em risco a privacida de dos internautas e, se aprovado, elevará o já elavado custo de comunicação no Brasil.

Gostaríamos de convidá-lo a participar do ato público que será realizado no dia 14 de maio, às 19h30, em defesa da LIBERDADE NA INTERNET CONTRA O VIGILANTISMO NA COMUNICAÇÃO EM REDE CONTRA O PROJETO DE LEI SUBSTITUTIVO DO SENADOR AZEREDO

O Ato será na Assembléia Legislativa de São Paulo e será transmitido em streaming para todo o país pela web.

PLENÁRIO FRANCO MONTORO
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DE SÃO PAULO
AV PEDRO ALVARES CABRAL S/N – IBIRAPUERA

O Ato também terá cobertura em tempo real pelo Twitter e pelo Facebook.

Contamos com a sua presença.

Este post foi originalmente publicado no blog do Sérgio Amadeu

Assine a petição contra o projeto
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Obrigado, Boal

maio 11, 2009

por Eduardo Sposito

Todos os que naqueles tempos ousamos mexer com teatro tinhamos uma profunda admiração pelo Boal e aprendemos muito com ele. No meu caso pessoal, o “tema” do meu casamento foi buscado no “Arena conta Zumbi”, de Boal e Guarnieri, em especial o texto inspirado em “Na selva das cidades” do Brecht.

Além disso, ainda no seminário católico onde fazia filosofia, numa exibição no palco do teatro paroquial na Igreja Santa Terezinha no Jaçanã, ousamos reproduzir um trecho do “Revolução na América do Sul” do Boal. Vou tentar reproduzir o conteúdo do texto, que foi onde recebi minha primeira aula de sociologia sobre o funcionamento do sistema capitalista.

Era a história de um operário – José da Silva( se não me engano) – que vai pedir um aumento ao patrão, pois seu filho “que nasceu ontem” estava chorando de fome e ele não tinha como comprar o leite. O patrão bonzinho resolve atender o pedido.

O Zé, todo feliz, resolve passar no açougue pra comprar um pedaço de carne, no lugar do osso que ele sempre comprava para a sopa. Aí começa o drama: a carne tinha aumentado de preço. Ele reclama com o açougueiro, que manda ele reclamar com o dono do caminhão, que era o culpado, porque aumentou o frete. O dono do caminhão diz que o culpado era o dono pneu, que tinha aumentado o preço do pneu.

O dono do pneu era seu patrão então ele vai reclamar dizendo que ele era o culpado pelo aumento do preço da carne. O patrão então lhe diz:”O culpado é você que pediu aumento e eu tive que aumentar o preço do pneu.” Aí o Zé conclui: “O culpado não sou eu. O culpado é meu filho que nasceu ontem e estava chorando de fome. Moleque safado: tão novo e já está desorganizando a economia do país.” (Mais tarde o Chico desenvolve o mesmo tema em “Opera do Malandro”).

A imagem que eu tenho do Boal está marcada pelo texto acima. E no curso de Ciências Sociais que fiz depois, pouca coisa foi acrescentada ao que está dito aí. Na hora que estou escrevendo este texto, recebo uma ligação dizendo que a Sheila, do grupo de teatro Desafio daqui de São José do Rio Preto, está muito triste com a morte do Boal. E a Sheila tem só 21 anos. Acho que é a melhor homenagem que o mestre poderia receber.

Obrigado, Boal.

1969 – O Teatro perde Cacilda Becker

maio 5, 2009

 

Parece que nos útimos dias, o blog inclina-se para o teatro. Também está de luto com a morte de Boal. Coisas fortes como essa parecem criar um viés imaginativo, senão energético. Procurando por um registro do dia 6 de maio de 1969, deparo-me com um texto que fala da morte de Cacilda Becker. Já que o tema é teatro e o penúltimo registro de morte, vai lá:

14 June, 2008 | Posted by: lucyannemano

Jornal do Brasil: Sábado, 21 de junho de 1969 - página 5

Cacilda morreu. O teatro, aqui mais do que qualquer das outras artes, é ingrato, pois não nos oferece sequer a possibilidade da retrospectiva que o cinema usa para honrar seus mortos. A cada um de nós, individualmente, a lembrança de Cacilda no palco poderá enriquecer ainda, e por muito tempo. Mas não poderemos oferecer às novas gerações a mesma experiência. E elas serão mais pobres por isso…
Não nos será mais possível, em nossos momentos de luta, contar com seu entusiasmo, com o brilho de seu olhar ou com o calor de sua emoção, ou a força de sua coragem. E nós seremos mais pobres por isso
“.
Barbara Heliodora

O teatro brasileiro perdeu um de seus maiores expoentes de todos os tempos. A atriz paulista Cacilda Becker Yáconis, 48 anos, saiu prematuramente de cena, no auge da sua capacidade criadora, quando tudo levava a crer que ultrapassaria, nos futuros desempenhos, tudo que havia feito até então. Morreu após 38 dias de internação num quadro irreversível de derrame cerebral.

Primeira página do Jornal do Brasil: Quinta-feira, 8 de maio de 1969.

Quando tudo parecia definitivo, Cacilda Becker surpreendia com uma atitude inovadora, uma posição vanguardista, uma interpretação inesperada. Assim firmou-se fazendo da sua vida o teatro, e do teatro a sua vida. Exemplo de coragem, lucidez e intrépido espírito em defesa da cultura brasileira, atuou incansavelmente. Nem tudo foi fácil, nem tudo foi certo. Apenas verdadeiro. Se para o grande público o reconhecimento advinha da excelência da sua interpretação, ela foi decisiva para o amadurecimento da consciência profissional da classe teatral. Colocou-se aguerrida a serviço da arte dramática. Desgastou-se fisicamente, prejudicou-se economicamente, mas foi audaz até o fim na integridade e na dignificação do teatro brasileiro.

 

Jornal do Brasil: Espetáculo Esperando Godot. Caderno B, página 5

O súbito fim do último espetáculo
Uma Cacilda Becker maltrapilha, ou Estragon, personagem de Samuel Beckett, olha para seus pés machucados e geme, e a dor que quer transmitir parece ser sentida por todo o público. Walmor Chagas, ou Wladimir, também um mendigo, aparece, e se une a ela para juntos fazerem o que a platéia do teatro sabe ser absurdo, mas que não deixa de comovê-la, todas as noites: Esperar Godot. No fim do primeiro ato do espetáculo, no dia 6 de maio de 1969, Vladimir pergunta: “Então, vamos?” Estragon responde: “Vamos”. E a luz se apaga. Cacilda sai de cena para o intervalo, sente-se mal, e não volta mais aos palcos.

Pete Seeger faz 90 anos

maio 3, 2009

pete_seeger-3Li no twitter de Jordi Adell que o grande cantor e divulgador de canções socialmente engajadas, Pete Seeger, aniversaria hoje. Faz noventa anos. Um showzaço no Madison Square Garden, NY, com grandes nomes da música dos sessenta, marcará a data. A notícia indicada pelo Jordi pode ser encontrada aqui.

Nota. Conheço o Jordi de encontros na Web. Ele trabalha com tecnologia educacional e já publicamos matéria num mesmo número de Quaderns Digitals. Trocamos um ou dois e-mails. Ele é amigo de uma ciberamiga minha, Carmé Barba. Gente simpática. Ao ver sua indicação sobre Seeger, a simpatia aumentou. Parece que a gente advinha por sinais difíceis de determinar quem anda pela esquerda desde os tempos de estudante nos anos sessenta.

Augusto Boal

maio 2, 2009

boal

O dramaturgo e diretor teatro Augusto Boal morreu na madrugada deste sábado- 02 de maio, aos 78 anos.

O trabalho do carioca Boal, que também era ensaísta e teórico do teatro, ganhou destaque nos anos 1960 e 1970, quando esteve à frente do Teatro de Arena de São Paulo e criou o Teatro do Oprimido,
pelo qual foi internacionalmente reconhecido por aliar arte dramática à ação social. Para ler mais sobre Augusto Boal
clique aqui

Veja aqui vídeo mostrando homenagem a Augusto Boal, por ocasião de seu aniversário em 24 de março de 2009.

Leia também: CARTA DO MST A AUGUSTO BOAL.

Entrevista com Augusto Boal em Página 38